STF Pode Redefinir o Alcance da Imunidade do ITBI: O Voto de Fachin e o Impacto para Empresas e Municípios
- Patrick Pelucio
- 18 de out.
- 5 min de leitura
Por Patrick de Pelucio

A imunidade do ITBI em foco
O imposto ITBI incide quando há transmissão de bens imóveis ou direitos a eles relativos. A Constituição Federal, no art. 156, § 2º, inciso I, prevê imunidade tributária em determinadas hipóteses — notadamente quando ocorre a “transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital”.
Conforme texto:
“O imposto não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital…
”Além disso, há a ressalva de que não se aplica nas “fusões, incorporações, cisões ou extinção de pessoa jurídica” salvo se estiver caracterizada atividade preponderante de compra, venda ou locação de bens imóveis.
Assim, o tema que o STF está julgando — sob o Tema de repercussão geral nº 1348 (RE 1.495.108/SP) — é: até que ponto essa imunidade se aplica nas operações de integralização de capital social mediante imóveis, especialmente quando a pessoa jurídica receptora tem atividade preponderante no setor imobiliário.
No decorrer do julgamento, o ministro Edson Fachin, relator do processo, proferiu voto no qual defende que a imunidade do ITBI, na hipótese de integralização de bens ou direitos imóveis ao capital social, seja incondicionada à atividade preponderante da empresa. Em suas palavras, a tese proposta foi:
“A imunidade tributária do ITBI, prevista no art. 156, § 2º, I, na realização de capital social mediante integralização de bens e valores, é incondicionada, portanto, indiferente a atividade preponderantemente imobiliária.”
Ou seja: segundo esse voto, mesmo que a empresa receptora dos imóveis tenha como atividade principal a compra, venda ou locação de imóveis — normalmente uso pela Administração para afastar imunidade —, essa condição não deveria impedir o benefício da imunidade quando o objeto for integralização de capital.
O relator também ressalta que a exceção “atividade preponderante imobiliária” teria sido concebida para as operações de reorganização societária (fusões, cisões, incorporações ou extinções) e não para toda hipótese de transmissão de imóveis para integralização de capital.
Até o momento, segundo a cobertura da mídia, três ministros acompanharam o relator (Fachin, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin) favoravelmente à imunidade ampliada.
Entretanto, o julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, tendo ainda prazo para retomada.
O resultado final, portanto, ainda não está sacramentado, mas a tendência das decisões até agora indica uma forte inclinação em favor dos contribuintes/empresas.
Por que isso importa — e por que gera controvérsia
Benefícios para quem planeja patrimônio
Se prevalecer esse entendimento (imunidade incondicionada para integralização de imóveis ao capital social), haverá efeitos práticos relevantes:
Empresas de diversos setores — inclusive do ramo imobiliário — que utilizam imóveis para compor capital social poderão evitar o pagamento do ITBI em tais operações, o que reduz custo/ônus tributário.
Maior segurança jurídica para operações de reorganização patrimonial, constituição de holdings, aporte de imóveis, planejamento sucessório, etc.
Estímulo à formalização e ao uso de estruturas mais eficientes — com menos “freio tributário” nessa modalidade de transmissão.
O lado dos municípios e da arrecadação
Por outro lado, a mudança gera impacto para os entes municipais e para a arrecadação local:
Municípios historicamente têm cobrado ITBI nessas operações, especialmente quando a empresa receptora está no ramo imobiliário — entendendo que a ressalva da Constituição impede imunidade nestes casos. Essa cobrança representa receita para os cofres locais.
Uma sentença favorável à imunidade ampliada implicará menor arrecadação possível ou exigirá ajustes nos cálculos de impacto das finanças municipais.
Pode gerar contencioso abundante (réplicas, revisões, devoluções) enquanto a jurisprudência se consolida.
Sobre segurança jurídica e igualdade de tratamento
Do ponto de vista jurídico, há boas razões para buscar uniformidade e clareza:
O art. 156, § 2º, I, visa dar tratamento diferenciado (isenção/imunidade) a uma operação específica – a incorporação de bens/direitos ao patrimônio de pessoa jurídica. Se a empresa exercita qualquer atividade, mas a operação se encaixa no texto, limitação adicional (como atividade preponderante) gera insegurança.
Uniformizar o entendimento facilita planejamento tributário legítimo, evita decisões divergentes entre municípios/Tribunais.
Por outro lado, se a imunidade for alargada demais, corre-se o risco de que operações que deveriam gerar ITBI acabem isentas, o que pode ser visto como privilégio indevido ou desequilíbrio entre contribuintes.
Minha opinião
Na minha visão, o voto do ministro Fachin representa um avanço bem-vindo para o ambiente de negócios no Brasil, por alguns motivos:
Estimula o empreendedorismo e a formalização patrimonial — Em vez de penalizar empresas por simples rearranjo societário ou aporte de imóveis em que o fim é legitimo (constituição/organização empresarial), a imunidade ajuda a dar fluidez ao mercado, reduzir custos, evitar “travamentos” tributários.
Segurança jurídica — Uma interpretação clara e uniforme beneficia todas as partes: contribuintes, municípios, sistema judiciário. Quando a regra é confusa ou varia de ente para ente, isso gera risco de litígio, custos altos, incerteza — o que não é bom para o ambiente econômico.
Justiça tributária — Se a Constituição escolheu conceder imunidade para essa situação (art. 156, § 2º, I), obrigar a comprovar que “atividade preponderante não seja imobiliária” parece criar um obstáculo que muitas vezes está além do que o texto constitucional exige. Em minha opinião, a interpretação mais fiel ao texto reforça a isonomia: empresas de diferentes ramos não devem ser penalizadas por exercerem atividade imobiliária se a situação é a mesma — a integralização de bens para capital social.
Limites são importantes — Isso dito, concordo que deve haver salvaguardas para coibir fraudes, simulação ou operações claramente tributariamente viciadas. O voto de Fachin reconhece essa necessidade de controle (por exemplo, no caso de reorganizações societárias).
Reflexos planejados mas atenção à arrecadação pública — Deve haver equilíbrio. Municípios devem estar preparados para impactos financeiros, ajustes de legislações municipais, revisões de previsão orçamentária. O ganho para o setor empresarial pode ser significativo, mas não pode implicar desequilíbrio financeiro ou desestímulo à arrecadação legítima.
Em resumo: acho que a interpretação ampliada da imunidade do ITBI é positiva, desde que acompanhada de bons critérios de controle e uma transição que leve em conta os efeitos orçamentários municipais. Gerar segurança jurídica é absolutamente necessário para melhorar o ambiente de investimentos no Brasil, e esse julgamento do STF pode ser um marco nessa direção.
Considerações finais
O julgamento no STF do Tema 1348 (RE 1.495.108/SP) ajuda a responder uma dúvida que persiste há anos entre contribuintes, advogados tributaristas, municípios e empresas do setor imobiliário: qual o alcance real da imunidade do ITBI em operações de integralização de capital social?Com o voto do relator Edson Fachin, a balança aponta para uma interpretação mais favorável ao contribuinte — imunidade incondicionada à atividade preponderante, salvo exceção nas reorganizações societárias. Mas até que o julgamento seja concluído, ainda há incertezas e riscos de litígio.Para quem está no mercado (seja incorporadora, holding familiar, empresa que vai aportar imóveis, ou investidor imobiliário), esse julgamento deve ser acompanhado de muito perto — não apenas pelos efeitos tributários diretos, mas pela lógica de planejamento que se abre.Do lado dos municípios, cabe atenção para ajustes, planejamento orçamentário e eventual revisão de práticas de cobrança.




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